quinta-feira, 30 de abril de 2015

O jornalismo integral, segundo Antonio Gramsci

 O jornalismo integral, segundo Antonio Gramsci
Resenha de Victor Lourenço
Antonio Gramsci (1891-1937) foi um homem a frente de seu tempo, um visionário, alguém que cumpriu uma importante missão, apesar das circunstâncias extremamente desfavoráveis. Esteve preso entre 1926 e 1937 e só foi libertado quando a saúde já estava precária, vindo a falecer três meses depois. A história deste cidadão italiano enche-nos de compaixão e orgulho, pois percebemos que, além de ser vítima da perseguição política, pelos fascistas, produziu reflexões dignas da história intelectual da humanidade. Tais reflexões extrapolaram em muito o alcance presumido nos escritos de Gramsci, o que indica a grandeza do seu pensamento, mais ainda pela oportunidade do assunto: o papel da imprensa nas sociedades capitalistas. Nesse sentido especial, apresento citações destacadas de um texto escrito por Gramsci, intitulado Jornalismo Integral, parte integrante do livro Os intelectuais e a organização da cultura, publicado no Brasil pela editora Civilização Brasileira, em 1995, com tradução de Carlos Nelson Coutinho.
Como complemento, faço alguns comentários sobre o contexto da época e da atualidade, quando se agrava a crise do jornalismo no Brasil e no mundo. Pensemos, então, como o autor, encarcerado e dilacerado pelas dúvidas quanto ao destino do movimento operário no momento em que o fascismo tomava conta da Itália.
“O tipo de jornalismo estudado nestas notas é o que poderia ser chamado de ‘integral’, isto é, o jornalismo que não somente pretende satisfazer todas as necessidades (de uma certa categoria) de seu público, mas pretende também criar e desenvolver estas necessidades e, consequentemente, em certo sentido, criar seu público e ampliar progressivamente sua área” (A. Gramsci, 1995: 161)
Vemos aqui o embrião de uma situação que é atual, embora tenha profundas raízes: o jornalismo como fator de produção necessário ao modo capitalista de organizar a sociedade. O autor antevia o potencial formador do jornalismo, algo que foi sendo progressivamente ampliado, mas não sem consequências para o próprio jornalismo: quanto mais integrado ao sistema de consumo, menor ficava a influência espiritual e intelectual, no sentido preciso do seu esvaziamento moral.
“Se examinarmos todas as formas de jornalismo e atividades editoriais existentes, vê-se que cada uma delas pressupõe outras forças a integrar ou às quais coordenar-se. Para desenvolver criticamente o assunto, parece-me oportuno pressupor uma outra situação: a existência, como ponto de partida, de um certo agrupamento cultural mais ou menos homogêneo, de um certo tipo e com uma certa orientação; devemos pressupor ainda que se pretenda fundar-se em tal agrupamento para construir um edifício cultural completo, autárquico, começando precisamente pela língua”. (Idem, p. 162)
Nessa passagem temos duas noções fundamentais para o entendimento do pensamento de Gramsci: o conceito de intelectual orgânico e o conceito de hegemonia. São noções sobre as quais muito se discutiu, mas pouco se avançou, apesar da sua importância. Estes dois conceitos estão implícitos ao longo dos argumentos, embutidos, e, claro, poderão sempre ser melhor explicitados, para fazer justiça ao autor. Antes, no entanto, destaca-se o papel fundamental atribuído à lógica interna da linguagem. Diz Gramsci:
“Todo o edifício deveria ser construído de acordo com princípios racionais, isto é, funcionais, na medida em se tem determinadas premissas e se pretende atingir determinadas consequências. Por certo, durante a elaboração de um plano, as premissas necessariamente se modificam, dado que, se é verdade que uma certa finalidade pressupõe certas premissas, é também verdade que, durante a elaboração real da atividade determinada, as premissas são necessariamente modificadas e transformadas, e a consciência da finalidade (ampliando-se e concretizando-se) reage sobre as premissas, adequando-as cada vez mais. (...) mas se as finalidades começam progressivamente a se realizar, o fato mesmo desta realização, da efetibilidade alcançada, modifica necessariamente as premissas inicias, que porém não são mais iniciais e, consequentemente, modificam-se as finalidades imagináveis, e assim por diante”. (Idem, p. 162)
Gramsci tratou de um aspecto de extrema complexidade, com o qual a sociologia e a epistemologia contemporânea vêm se defrontando: a reflexividade das atividades humanas. Isto é, toda nova informação tem o potencial de mudar o comportamento dos seres humanos, alterando as bases iniciais do próprio processo de cognição. Gramsci explica esta reflexão usando o exemplo da alfabetização. Afirma que, em uma turma escolar que aprenda o alfabeto, isto não significa que o analfabetismo desapareça para sempre; pois todo ano aparecerá uma nova turma. E que quanto mais raro se tornar o analfabetismo entre os adultos, mais fácil será povoar as escolas elementares. Daqui ele parte para uma consideração do perfil dos leitores, tal como era entendido em sua época.
“Os leitores devem ser considerados a partir de dois pontos de vistas: 1) como elementos ideológicos, transformáveis filosoficamente, capazes, dúcteis, maleáveis à transformação; 2) como elementos econômicos, capazes de adquirir publicações e de fazê-las adquirir por outros. Os dois elementos, na realidade, nem sempre são destacáveis, na medida em que o elemento ideológico é um estímulo ao ato econômico da aquisição e da divulgação. Todavia, é necessário, quando se constrói um plano editorial, manter a distinção entre os dois aspectos. Outrossim, na esfera econômica, as possibilidades não correspondem à vontade e ao impulso ideológico; portanto, deve-se planejar de modo a que seja dada a possibilidade de aquisição indireta, isto é, compensada com serviços (divulgação)”. (Idem, p. 163)
Neste trecho abaixo mais uma vez ele se refere à modificação das premissas iniciais, uma vez posto em marcha o processo.
“Uma empresa editorial publica diversos tipos de revistas e livros, cuja gradação varia de acordo com os diversos níveis de cultura. É difícil estabelecer quantos clientes possíveis existem em cada nível. Deve-se partir do nível mais baixo e, sobre ele, pode-se estabelecer o plano comercial mínimo, isto é, a previsão mais realista, levando-se porém em conta que a atividade pode modificar (e deve modificar) as condições do ponto de partida, não somente no sentido de que a esfera da clientela pode (deve) ser ampliada, mas também de que pode (deve) ser determinada uma hierarquia de necessidades a satisfazer e, consequentemente, de atividades a desenvolver”. (Idem, p. 163)
Vemos que Gramsci elabora uma espécie de teoria do planejamento para empresas do ramo editorial, pensando e articulando diferentes níveis de produtos, adequados a cada tipo de público, de modo a alavancar a própria atividade editorial. E nisso ele revela toda a sua presciência e acuidade, muitas décadas antes de vir a existir a chamada pesquisa de mercado e o planejamento estratégico. Fazendo menção à burocratização das empresas, que embotava as iniciativas individuais, Gramsci acrescenta que é impossível falar de negócio jornalístico e editorial sério se não existir o elemento organização do cliente, da venda. E aqui um ponto extremamente relevante: “é uma observação generalizada a de que, num jornal moderno, o verdadeiro diretor é o diretor administrativo e não o diretor da redação” (Idem, P. 164), antecipando em décadas uma realidade que só seria verificada inteiramente na atualidade.
Outro ponto de grande interesse diz respeito a atividade de recenseamento da vida intelectual em um dado país, para manter-se atualizado o estado-da-arte. Gramsci recomenda expressamente ler as revistas dos jovens, e não somente aquelas que já se firmaram e que representam interesses sérios e bem estabelecidos.
“É dever da atividade jornalística (em suas várias manifestações) seguir e controlar todos os movimentos e centros intelectuais que existem e se formam no país. Todos. Isto é, com exclusão apenas dos que têm um caráter arbitrário e amalucado; se bem que mesmo estes, com o tom que merecem, devem pelos menos ser registrados. (...) Ao que parece, antes de mais nada, deve-se desenhar o mapa intelectual e moral do país, isto é, localizar os grandes movimentos de ideias e os grandes centros.” (Idem, p. 164)
Uma recomendação importante, que pode ser seguida hoje, é a que estabelece a distinção entre movimentos militantes, que são os mais interessantes, e movimentos de retaguarda, ou de ideias adquiridas e tornadas clássicas ou comerciais.
“É necessário reconhecer abertamente que, por si mesmas, as revistas são estéreis se não se tornam a força motriz e formadora de instituições culturais de tipo associativo de massa, isto é, cujos quadros não são fechados. O mesmo deve ser dito das revistas de partido; não é preciso crer que o partido constitua, por si mesmo, a instituição cultural da massa da revista, O partido é essencialmente político, e mesmo sua atividade cultural é atividade de política cultural; as instituições culturais devem ser não apenas de política cultural, mas de técnica cultural.” (Idem, p. 166)
Aqui uma referência ao papel central dos agrupamentos intelectuais, notadamente a dimensão política do jornalismo.
“Não pode existir associação permanente, com capacidade de desenvolvimento, que não seja sustentada por determinados princípios éticos, que a própria associação determina para seus componentes singulares, a fim de obter a capacidade interna e a homogeneidade necessárias para alcançar o objetivo. Nem por isso deixam estes princípios de possuir caráter universal. (...) Uma associação normal concebe a sim mesma como uma aristocracia, uma elite, uma vanguarda, isto é, concebe a sim mesma como sendo ligada por milhões de fios a um determinado agrupamento social e, através dele, a toda a humanidade. Portanto, essa associação não se considera como algo definitivo e enrijecido, mas como tendente a ampliar-se.” (Idem, p. 167)
“A coletividade deve ser entendida como produto de uma elaboração de vontade e pensamento coletivos, obtidos através do esforço individual concreto, e não como resultado de um processo fatal estranho aos indivíduos singulares; (...) se devem existir polêmicas e cisões, é necessário não ter medo de enfrenta-las e supera-las: elas são inevitáveis nestes processos de desenvolvimento, e evita-las significa tão somente adia-las para quando já forem perigosas ou mesmo catastróficas”. (Idem, p. 168)
“Um organismo unitário de cultura, que oferecesse aos diversos estratos do público os três tipos de revistas, ao lado de coleções de livros, satisfaria as exigências de uma certa massa de público, que é mais ativa intelectualmente, mas somente no estado potencial, e que importa mais elaborar, fazer com pense concretamente, transformar, homogeneizar de acordo com um processo de desenvolvimento orgânico que eleve do simples senso comum ao pensamento coerente e sistemático”. (Idem, p. 169)
Gramsci elaborou um planejamento editorial, composto de diversas seções específicas, dedicadas aos diferentes temas, e cita três tipos de revista, que importa destacar: uma que combine elementos diretivos, outra do tipo crítico, histórico e bibliográfico; e um terceiro, que combine os elementos dos tipos anteriores. Adiante, ele explica como deveria ser uma revista do segundo tipo.
“Nas revistas deste tipo, são indispensáveis algumas rubricas [seções], como um dicionário enciclopédico político-científico-filosófico, no seguinte sentido. Em cada fascículo, deve-se publicar uma ou mais pequenas monografias de caráter enciclopédico sobre conceitos políticos, filosóficos e científicos que aprecem frequentemente nos jornais e nas revistas, e que o leitor médio dificilmente compreende. Na realidade, toda corrente cultural cria a sua linguagem, isto é, participa do desenvolvimento geral de uma determinada língua nacional, introduzindo termos novos, enriquecendo de conteúdo novo termos já em uso, criando metáforas, servindo-se de nomes históricos para facilitar a compreensão e o julgamento de determinadas situações atuais”. (Idem, p. 170)
Para a construção de um pensamento hegemônico, mas não totalitário, Gramsci mostra um entendimento sui generis do conjunto da sociedade, indo contra a maré montante da fragmentação e do individualismo.
 “A elaboração nacional unitária de uma consciência coletiva homogênea requer múltiplas condições e iniciativas. A difusão, por um centro homogêneo, de um pensar e de agir homogêneo é a condição principal, mas não deve e não pode ser a única. Um erro muito difundido consiste em pensar que toda camada social elabora sua consciência e sua cultura do mesmo modo, com os mesmos métodos, isto é, com os métodos dos intelectuais profissionais. O intelectual é um profissional que concebe o funcionamento de máquinas próprias especializadas; tem o seu tirocínio e seu sistema ‘Taylor’ próprios. É pueril e ilusório atribuir a todos os homens esta capacidade adquirida e não inata... “(Idem, p. 173)
Outro ponto fundamental, que serve como uma diretriz para o jornalismo, diz respeito ao método de trabalho como parte integrante da atividade, em conexão com a realidade.
“A repetição paciente e sistemática é um princípio metodológico fundamental, mas não a repetição mecânica, obsessiva. Porém, é necessária a adaptação de cada conceito às diversas peculiaridades e tradições culturais, sua apresentação e reapresentação em todos os seus aspectos positivos e em suas negações tradicionais, relacionando sempre cada aspecto parcial à totalidade. (...) O trabalho educativo-formativo desenvolvido por um centro homogêneo de cultura, a elaboração de uma consciência crítica (por ele promovida e favorecida) sobre uma base histórica, este trabalho não pode limitar-se a simples enunciação teórica de princípios claros. O trabalho necessário é complexo e deve ser articulado e graduado: deve haver dedução e indução combinadas, lógica formal e lógica dialética, identificação e distinção, demonstração positiva e destruição do velho. Mas não de modo abstrato, e sim concreto, sobre a base real e da experiência efetiva”. (Idem, p. 174)
O aspecto formativo, que faz parte da função social do jornalismo, aparece mais uma vez no pensamento agudo de Gramsci.
“Nesta mesma ordem de observações, insere-se um critério mas geral: as modificações nos modos de pensar, nas crenças, nas opiniões, não ocorrem mediante explosões rápidas, simultâneas e generalizadas, mas sim, quase sempre, através de combinações sucessivas, de acordo com fórmulas, de autoridade variadíssimas e incontroláveis. A ilusão explosiva nasce da ausência de espírito crítico. (...) Na esfera da cultura, aliás, as explosões são ainda menos frequentes e mãos menos intensas do que na esfera técnica, na qual uma inovação se difunde, pelos menos no plano mais elevado, com relativa rapidez e simultaneidade. Confunde-se a explosão de paixões políticas acumuladas num período de transformação técnicas, às não correspondem novas formas de organização jurídica adequada, com as transformações culturais, que são lentas e graduais.” (Idem, p. 175)
Gramsci interrompe sua descrição dos tipos de revista para tratar da formação dos redatores, e de como estes profissionais atuam para modificar os modos de pensar e de modificar a opinião média na sociedade.
“O tipo de revista político-crítica exige um corpo de redatores especializados, em condições de fornecer, com certa regularidade, um material cientificamente elaborado e selecionado; a existência deste corpo de redatores, que tenha atingido em si um certo grau de homogeneidade cultural, não é absolutamente coisa fácil; trata-se de um ponto de chegada no desenvolvimento de um movimento cultural.” (Idem, p. 176)
Mais uma vez, demonstrando uma percepção apurada do comportamento humano, Gramsci explica como o senso comum pode (e deve) ser modificado para acompanhar o progresso científico.
“Cada camada social tem seu senso comum e seu bom senso, que são, no fundo, a concepção de vida e do homem mais difundida. Cada corrente filosófica deixa uma sedimentação de senso comum: é este o documento de sua efetividade histórica. O senso comum não e algo rígido e imóvel; ele se transforma continuamente, enriquecendo-se com noções científicas e com opiniões filosóficas que penetram no costuma. O senso comum é o folclore da filosofia, e ocupa sempre um lugar intermediário entre o folclore propriamente dito e a filosofia, a ciência, a economia dos cientistas. O senso comum cria o futuro folclore.” (Idem, p. 178)
Na atualidade, quando os grandes jornais corporativos enfrentam o declínio de suas audiências, e como tiragens cada vez menores, acadêmicos e especialistas debatem o chamado ‘modelo de negócio’, pensando em como salvar o jornalismo convencional. Agora, lendo o que Gramsci escreveu nos anos 1930, se percebe o quão pouco se evoluiu no entendimento do que seja a função da imprensa na sociedade. A estratégia de vender informação como produto se revela suicida quando despreza o fundamental: o compromisso com a verdade e com o leitor.
“O problema fundamental de todo periódico (cotidiano ou não) é o de assegurar uma venda estável (se possível em contínuo incremento), o que significa a possibilidade de construir um plano comercial. Por certo, o elemento fundamental de para a sorte de um periódico é o ideológico, isto é, o fato de que satisfaça ou não determinadas necessidades intelectuais, políticas. Mas seria um erro crer que este seja o único elemento e, notadamente, que este seja válido tomado isoladamente. Só em condições excepcionais ocorre que uma opinião tenha sorte independentemente da forma exterior na qual seja apresentada. O modo de apresentação tem grande importância para a estabilidade do negócio. (...) O exterior de uma publicação deve ser cuidado com a mesma atenção que o conteúdo ideológico e intelectual; na realidade, as duas coisas são inseparáveis.” (Idem, p. 179)
“Uma revista, como um jornal, como um livro, como qualquer outro modo de expressão didática que seja planejado tendo em vista uma determinada média de leitores, de ouvintes, de público, não pode contentar a todos na mesma medida, ser igualmente útil a todos; o importante é que seja estímulo a todos, pois nenhuma publicação pode substituir o cérebro pensante ou determinar ex novo interesses intelectuais e científicos onde só existir interesses pelos bate-papos de café. (...) Por isso, não se deve ficar confuso com a multiplicidade de críticas, isso é a prova de que se está no bom caminho.” (Idem, p. 180)
Um dos pontos mais importantes para o jornalismo, diz respeito a distinção entre o meramente informativo e o político, dirigido a um público específico, e mais adiante, o jornal de Estado. Para melhor compreender a profundidade deste pensamento, é preciso conhecer o modo como a ciência política classifica os diferentes tipos de regimes. Notemos, no entanto, que Gramsci indica uma função essencial para os jornais, a qual ainda hoje permanece válida: servir também como educador da população adulta.
“Distingue-se o chamado jornal informativo ou sem partido explícito do jornal de opinião, do órgão oficial de um determinado partido; ou seja, o jornal para as massas populares ou jornal popular, daquele jornal dedicado a um público necessariamente restrito”. (Idem, p. 188)
“Napoleão III quisera fazer do diário oficial uma folha modelo, distribuída gratuitamente a cada eleitor, com a colaboração das mais ilustres penas da época e com informações mais seguras e confirmadas de toda parte do mundo. A polêmica, excluída, seria confinada aos jornais particulares. A concepção de jornal de Estado é logicamente ligada às estruturas governamentais não-liberais (isto é, aquelas nas quais a sociedade civil se confunde com a sociedade política), sejam nas despóticas ou democráticas (ou seja, quer naquelas onde a minoria oligárquica pretende ser toda a sociedade, quer naquelas onde o povo indistinto pretende e acredita ser verdadeiramente o Estado). Se a escola é do Estado, porque não será do Estado também o jornalismo, que é a escola dos adultos? (Idem, p. 191)
Considerações finais
Para finalizar esta resenha, recorro ao memorável artigo de Otto Maria Carpeaux, publicado em 1966, no qual faz uma pequena biografia de Gramsci. Diz assim:
A história das suas lutas, do seu martírio no cárcere e das vitórias póstumas do seu espírito é leitura edificante para os adeptos do credo político que foi o seu. Mas suas atividades de altiva independência em parte só agora reveladas, também o tornam caro a todos os que apreciam a heresia, the right to dissent, em suma: a liberdade. A recordação de Gramsci deve ser igualmente cara a todos os que reivindicam a verdadeira democracia, contra as hipocrisias do elitismo.

A leitura atenta e o escrutínio minucioso do pensamento de Gramsci servem, e muito, a todos que se dedicam às questões sociais e históricas, sobretudo em tempos de crise e questionamentos do modo neoliberal de organizar a produção e do pensamento único que a grande mídia corporativa dissemina. O jornalismo empresarial nasceu como um subproduto do capitalismo industrial e logo tornou-se um departamento ligado à promoção de novas necessidades do ‘mercado’. Hoje vemos onde essa estratégia levou, e as empresas editoriais estão à beira da falência por conta desse descaso com a função primordial do jornalismo: a formação honesta e coerente da opinião pública. Fica a recomendação.

Um comentário:

  1. As suas reflexões sobre os escritos de Gramsci são muito profundas e agudas. "(...) ele revela toda a sua presciência e acuidade, muitas décadas antes de vir a existir (...)" Esta visão foi uma das principais características do pensamento de Gramsci em todas as esferas da vida cultural e política. Neste momento de profunda crise econômica e política italiana onde governa uma esquerda que parece direita Gramsci é uma luz, uma guia intelectual e moral. Sou italiana, muito italiana, e estou orgulhosa e feliz que o pensamento de Gramsci é conhecido no outro lado do mundo, no seu Brasil. Obrigada Victor, obrigada com todo o meu coração>>

    Um abraço e um sorriso
    Marci

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